‘Rompendo Preconceitos - do Abrigo à Adoção'. Este foi o tema central do III Encontro Sergipano de Adoção realizado nos dias 10 e 11 de dezembro de 2007, no auditório da Escola Superior do Ministério Público de Sergipe. O encontro, que teve como objetivo contribuir para a nova cultura de adoção, fortalecer parcerias e redes de atenção à criança e adolescente que necessitam da garantia do seu direito fundamental de conviver em ambiente familiar saudável, foi aberto oficialmente pela Procuradora-Geral de Justiça e, após, houve a palavra da Presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família, Seccional do Estado de Sergipe (IBDFAM/SE), Adélia Moreira Pessoa.

Com o tema ‘Do abrigo à Adoção: rompendo preconceitos na colocação familiar', o expositor Fernando Freire, que é Psicólogo e Consultor para assuntos relacionados à adoção de entidades nacionais e internacionais Unicef/Haiti, começou sua apresentação com depoimentos emocionantes de crianças deixadas pelos pais em abrigos, mostrando a triste realidade existente da adoção.

"Minha mãe me deixou aqui. De noite eu penso nela, quero que ela me leve para casa. Quero ficar pertinho da minha mãe. Antes de eu vir para cá a gente sempre brincava. Daí eu vim para cá e não deu mais para a gente brincar. Eu não abracei ela. Não quero mais morar no abrigo porque esses meninos me batem. Esses meninos maiores aqui deste quarto me batem se eu não emprestar a minha bola. Eles me dão murros, me chutam, me xingam de um monte de palavrão. Minha mãe mora no Pedregal. Ela me tratava bem. Ela me batia mais ou menos. Meu pai não mora com a minha mãe. Ele saiu de casa para beber. Não vou embora porque minha mãe não vem me buscar", relato de uma criança de 7 anos.

Outro relato emocionante é de uma adolescente de 14 anos que não vê perspectiva em ser adotada. "Estou aqui porque minha mãe não me quer. Não sei quem é o meu pai o nome dele nem tá no meu documento. Nem minha vó sabe o nome dele. Eu queria uma família nova. Sei que se eu ficar aqui até os meus 18 anos eu não arrumo mais. Não vou ter meu futuro construído. Tenho esperança de ser adotada. A maioria dos pais quer adotar meninos pequenos, de 5 para baixo, bebês. Eles vão crescer e vão pensar que são o próprio deles. Aqui no orfanato por que as vez eu fico no canto e fico pensando na minha vida, me dá uma vontade de ir embora. Os dias mais alegres aqui são os dias de aniversário, os dias tristes são quase todos os outros".

Sobre esse panorama, no qual está inserido o sistema de adoção no Brasil, o expositor Fernando Freire pontuou o que é preciso para promover as mudanças necessárias, mostrando que adoção é um ato de amor e desafio, sobre o qual pesam alguns fatores de risco, sejam provenientes dos técnicos, dos adotantes ou da criança/adolescente.

No âmbito dessas relações, que ultrapassam o simples ato de filantropia e de caridade, o que compete à autoridade Judiciária? "A colocação da criança ou adolescente em adoção. Nestes casos, um estudo psicossocial, elaborado por equipe interprofissional, deve subsidiar o processo. A despeito de tais determinações, contudo, um problema que ainda ocorre no país é a entrega direta de crianças para adoção, sem a mediação da Justiça - procurada mais tarde tão somente para regularizar a situação do ponto de vista legal", explicou Fernando Freire.

De acordo com Freire, tal situação é dramática, uma vez que "dentre as crianças e adolescentes abrigados nas instituições pesquisadas (IPEA-2004) apenas 10,7% estavam judicialmente em condições de serem encaminhadas para a adoção. Além disso, apenas metade desses meninos e meninas (54%) abrigados tinham processo judicial. A outra metade, por certo, lá estava sem o conhecimento do Judiciário, já que muitas crianças e adolescentes foram encaminhados aos abrigos pelas próprias famílias (11,1%), pela polícia (5,5%), dentre outras instituições que, judicialmente, não teriam tal prerrogativa", acrescentou.

Quanto ao Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária, apresentado pelo expositor, este consiste na defesa de que: políticas preventivas proporcionem a permanência da criança e do adolescente com sua família de origem; o afastamento do ambiente familiar seja medida excepcional e provisória; realize-se um investimento efetivo para a reintegração familiar, desde o primeiro dia da separação da criança ou do adolescente de sua família; haja comunicação permanente entre os serviços de acolhimento e a Justiça da Infância e Juventude; não se assuma uma postura de defesa intransigente dos laços biológicos, mas sim de laços afetivos e estruturantes para a personalidade da criança e do adolescente; a adoção seja medida excepcional, realizada apenas quando esgotadas as possibilidades de reintegração à família de origem; avaliem-se as situações caso a caso, tendo sempre como princípio norteador básico o melhor interesse da criança e do adolescente.

Por fim, o expositor concluiu sua apresentação falando sobre o desejo e necessidade de se ter uma criança. "Quando um casal, ou uma pessoa, decide adotar, deveria se perguntar, com toda a sinceridade: "Desejamos verdadeiramente uma criança ou, apenas, temos necessidade de uma criança?"".

A Psicóloga e Professora da Universidade Tiradentes, Marlizete Maldonado Vargas, coordenou os debates, no qual foram debatedoras a Promotora de Justiça e Diretora do NAIA, Maria Conceição Figueiredo Rolemberg e a Assistente Social e Professora da Universidade Federal de Sergipe, Etelvina Campelo Leal.

Já no segundo dia de encontro (11/12), foram apresentados relatos de pesquisas realizadas por alunos do curso de Psicologia da UNIT, com os temas: Abrigos de Aracaju e Vínculos Afetivos nas Instituições, por Larissa Araújo Silva - Psicóloga e ex-bolsista do PIBIC/CNPq e Adoções Necessárias: concepções e motivações de pretendentes e pais adotivos, por Deivid Feitosa e André Calazans - acadêmicos do curso de Psicologia da UNIT e bolsistas do PIBIC/CNPq.

A coordenação dos debates ficou a cargo da Promotora de Justiça da 1ª Curadoria da Infância e Adolescência da Comarca de Aracaju, Maria Lílian Mendes Carvalho, tendo como debatedor o Psicólogo Fernando Freire. Após os debates houve a apresentação do GAASE - Grupo de Apoio à Adoção de Sergipe: "para uma nova cultura da adoção em Sergipe". Sendo seguida de relatos de experiências de famílias adotivas, debates, proposta de trabalhos e encaminhamentos, finalizando assim o III Encontro Sergipano de Adoção.